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11/01/2017 - STJ e a pensão por morte do menor sob guarda: proteção ou restrição social?
11/01/2017
Resumo: Reflexão doutrinária e jurisprudencial referente ao menor sob guarda, enquanto dependente extinto da legislação previdenciária para efeitos de pensão por morte junto ao RGPS e o posicionamento do STJ, enquanto Tribunal de Pacificação Social dentro da análise temporal do benefício e suas alterações legislativas.
Palavras-chave: Pensão Por Morte; Menor sob Guarda; Equiparação, STJ.
Abstract: Reflection for the doctrinal and jurisprudential minor under guard, while the former depends on the social security legislation for the purposes of death benefits by the RGPS and positioning of the Supreme Court, as the Court of Social Pacification in the temporal analysis of the legislative changes and their benefits.
Keywords: Death pension; Minor under guard; Equalization, Supreme Court.
Sumário: Introdução; Pensão por Morte. Prestação Previdenciária do RGPS. Destinatários Específicos. Evolução Histórica e Legislativa; o Menor Designado. Guarda Judicial, Relação de Dependência; A análise do STJ e o requisito temporal de Incidência. Equiparação; Conclusões; Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O Colendo Superior Tribunal de Justiça, conhecido também como Tribunal da Cidadania, dentro de suas destacadas incumbências jurisdicionais, comporta, em duas específicas Turmas Julgadoras, a análise sempre pontual das relações previdenciárias, sendo um verdadeiro interpretador de toda celeuma advinda da Seguridade Social, que apesar de ganhar na Lei Excelsa, capítulo e estruturação própria, ex vi do artigo 194 e seguintes do Texto Político, por certo que é na legislação hodierna que suas diretrizes se consolidam.
No presente e singelo estudo, visou-se a análise pontual de uma prestação previdenciária por excelência, quer seja a Pensão por Morte, mas não em toda a sua extensão e abrangência.
De fato, importante a abordagem da aplicação dos consectários deste benefício, mas sobre um específico destinatário, a do menor designado por força de guarda judicial e sob a ótica do STJ, pacificador-mor de todo o embate legislativo.
PENSÃO POR MORTE. PRESTAÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO RGPS. DESTINATÁRIOS ESPECÍFICOS. EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGISLATIVA.
Com efeito, mister delimitar aqui o cerne de toda a vertente discussão, sobretudo para demonstrar, o acerto ou não da interpretação conferida pelo STJ, nesta reflexão não só jurídica, mas sim, a social que se é esperada, quando a abordagem envolve o pacote previdenciário.
O Sistema de Seguridade Social trabalha com regimes jurídicos, para que seus preceitos basilares, aliás, de dimensão constitucional se convalidem para os seus sujeitos protegidos.
Assim, há necessidade de alocação constitucional e sistemática, por conta da exigência de que um instrumento jurídico de suma importância seja estruturado a ponto de ser harmônico e eficaz.
Logo, não há como ventilar relação previdenciária em si, divorciada de um planejamento constitucional sistemático e protetor por excelência.
O Professor Fábio Lopes Vilela Berbel conceitua aludido Sistema da seguinte forma:
“Desta forma, pode-se dizer, em princípio, que Sistema de Seguridade Social é o conjunto de regras e princípios estruturalmente alocados, com escopo de realizar a Seguridade Social que, a partirde uma visão meramente política, seria a proteção plena do indivíduo frente aos infortúnios da vida capazes de levá-lo à indigência, ou seja, a proteção social da infelicidade individual”. [1]
Portanto, evidente que qualquer prestação previdenciária conferida dentro e um regime específico, detém nítido lastro protetivo e social, tendo em vista que o Legislador Ordinário elegeu os benefícios previdenciários como verdadeiros direitos sociais, conforme reza o artigo 06º, caput do Texto Maior.
A Pensão por Morte, atualmente alocada nos artigos 74 a 79 do Plano de Benefícios, Lei 8.213/91, bem como, nos artigos 105 a 115 do Regulamento Geral, Decreto-Lei 3.048/99, se trata de um benefício previdenciário de prestação continuada, que não depende de contribuições mínimas, mas, em regra, prescinde da qualidade de segurado e filiação do instituidor da pensão.
Pode assim ser originária, ou seja, advinda da plena relação previdenciária do falecido, quando integrante de uma das categorias de filiação ao sistema, ou derivada, quando advinda do gozo, pelo falecido, de um benefício previdenciário.
Entretanto, seus requisitos basilares nem sempre foram assim.
É que a Lei Eloy Chaves, de 1923, exigia-se do segurado mais de dez anos de efetivos serviços à empresa para os dependentes adquirirem o direito à pensão. Também, na Lei Orgânica da Previdência Social de 1960, a conhecida LOPS, a pensão somente se justificaria se houvesse comprovadamente a existência de doze contribuições mensais do falecido segurado.
Atualmente, como prenunciado, inexiste esta obrigação legal, de quantia mínima de contribuição do falecido, mas sim, em regra, apenas a demonstração de sua filiação ao Sistema, ou seja, sua qualidade de segurado.
Trata-se assim, de um benefício de risco, sendo desnecessário e não razoável exigir a carência, pois a morte, ao contrário da maternidade, por exemplo, se trata de um verdadeiro risco social e não contingência, sendo incerto e imprevisto o seu acontecimento, razão de que sua ocorrência, não programada por todos, deve estar inserida dentro de um pacote de proteção, para que os dependentes do falecido, se encontrem devidamente amparados.
Neste ponto, necessário o seu exaurimento para o enfrentamento do objeto central da presente reflexão.
Ocorre, que a pensão por morte atinge, é óbvio, os dependentes do falecido. Entretanto, este relacionamento jurídico não é direito com o Regime Jurídico Previdenciário em questão, mas sim reflexo, ou seja, mediante a relação previdenciária do falecido instituidor do benefício é que os dependentes são tutelados.
Trata-se, assim de relacionamento previdenciário indireto ou reflexo do dependente com o sistema previdenciário. Aqui, a diferenciação clara entre Segurado e Dependente.
De todo o modo, são ambos beneficiários da proteção, pois o artigo 01º do Plano de Benefícios não realizou nenhuma distinção a respeito.
Oportuna aqui a lição do Professor Miguel Horvath Junior, Procurador Federal, Mestre e Doutor pela PUC/SP a respeito:
“Beneficiário é toda a pessoa protegida pelo sistema previdenciário, seja na qualidade de segurado ou dependente. Os beneficiários são os sujeitos ativos das prestações previdenciárias”.[2]
Da mesma forma a legislação previdenciária vigente disciplina quem são esses dependentes, verdadeiros beneficiários não só da relação jurídica do instituidor, mas sim, de todo o sistema de proteção.
Com efeito, o atual artigo 16 da Lei de Benefícios e seus incisos, após sensíveis alterações legislativas, oriundas das Leis 9.032/95 e 9.528/97, objetivamente traz o rol de dependência e seus espectros legais.
Pois bem, além da adequação jurídica aos pressupostos de convalidação desta necessária dependência previdenciária, que não é automática em regra, devendo, em outras situações ser comprovada, outro ponto de partida se mostra notório dentro do campo de abrangência do benefício, aquecendo os debates e fomentando, pela jurisprudência o próprio melhoramento de modais jurídicos, quer seja, o marco inicial de observância normativa.
Aqui, o motivo central que move divergentes pontos de reflexão e estimula o aprimoramento dos estudos.
O MENOR DESIGNADO. GUARDA JUDICIAL. RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA.
Especificando a reflexão, uma abordagem intrincada do campo de atuação da pensão por morte ganha relevo, sobretudo nos Tribunais.
Dentro da análise da dependência jurídica e previdenciária, a Lei de Benefícios, em sua redação original, trazia um outro rol de dependência.
Assim, o que dispunha o artigo 16 em seu parágrafo segundo: “Equiparam-se a filho, nas condições do inciso I, mediante declaração do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob a sua guarda; e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação”.
Ao que se vê, havia uma maior possibilidade de se ampliar os dependentes previdenciários, mediante deliberação do instituidor conforme os requisitos legais da época. Neste aspecto, o menor designado ou indicado, quando inserido no instituto da guarda judicial.
Pois bem, ocorreu que tal previsibilidade não se perdurou por muito tempo, tendo em vista que a partir de 14 de outubro de 1996, data da publicação da Medida Provisória nº 1523, reeditada e convertida na Lei 9.528/1997, o menor abrangido por guarda judicial, deixou de integrar a relação de dependentes para as finalidades do sistema, cuja exclusão se dá até a presente data.
O Professor e Procurador Federal Hermes Arrais Alencar, leciona com clareza o que foi a vontade do legislador:
“A alteração legislativa buscou reverter o quadro crescente de avós que postulavam a guarda judicial dos netos, com o fim único de garantir a estes o direito de pensão por morte junto à previdência. Manipulavam o instituto da guarda judicial como se fosse instrumento de disposição de ultima vontade, na busca de outorgar ao neto o direito a beneficio previdenciário, consistente na pensão por morte”.[3]
Entretanto, citada exclusão legal, não foi bem aceita, tampouco comemorada por expressiva parcela da doutrina.
Tal defesa, aliás, lúcida e arrazoada, encontrando claro arrimo constitucional, em especial no artigo 227, § 3º da Lei Excelsa, senão vejamos:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá‑los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;”.
Ainda, a própria legislação específica ao instituto da guarda, abrangeu e estendeu esta previsibilidade constitucional.
Neste prisma a literalidade do artigo 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários”.
O Professor Wagner Balera, uma das vozes doutrinárias mais respeitadas no âmbito previdenciário, se manifestou a respeito:
“É estranhíssima a exclusão de menor sob guarda do rol de dependente, consoante dispunha a primitiva redação do § 2º do art.16. O pretexto utilizado pelo Poder Executivo para propor a exclusão foi o comum em todas as distintas fórmulas de redução de direitos sociais: a existência de fraudes. Contra essa cabal afronta aos direitos da criança e do adolescente carentes insurgiu-se o Ministério Publico que aforou diversas ações civis públicas propugnando pelo retorno à proteção social do menor sob guarda”.[4]
Dando azo ao entendimento de expressivo Jurista, aliás, Mestre, Doutor e Livre-Docente pela PUC/SP, verdade que o Ministério Público Federal aforou diversas ações civis públicas em toda a federação, porém, após os esperados embates judiciais, tão somente em Minas Gerais e em Tocantins, o menor sob guarda judicial continua inserido no rol de dependentes previdenciários, por força de decisões ainda vigentes na ACP nº: 1999.38.00.004900-0 da 29ª Vara Federal da Circunscrição Judiciária de Minas Gerais e na ACP nº: 1999.43.00.000326-2 do Estado de Tocantins.
Cabe aqui ressaltar que várias outras ACPs aforadas com o mesmo intento, apesar de liminares favoráveis e mesmo de sentenças de mérito positivas a respeito, atualmente, se encontram todas superadas, ou seja, com exceção de Minas Gerais e Tocantins, prevalece a exclusão do menor sob guarda, conforme a literalidade da atual legislação.
Ademais, perfilhou o entendimento esposado pelo STJ de que o contido no artigo 33 do ECA não pode ser aplicado aos benefícios mantidos pelo Sistema de Seguridade Social, em especial do Regime Geral, pois há lei de benefícios específica que trata da matéria.
Em que pese uma certa pacificação atual sobre o assunto, não se pode desnaturar os combativos argumentos contrários a exclusão, que fazem uma análise racional, harmônica e axiológica da proteção social conferida ao menor e adolescente, que dentre vários direitos, primou-se também, pela extensão aos previdenciários.
A ANÁLISE DO STJ E O REQUISITO TEMPORAL DE INCIDÊNCIA. EQUIPARAÇÃO.
Passadas essas preambulares e conceituais lições, de todo necessário ao fim deste breve estudo, oportuno demonstrar o posicionamento do Colendo STJ acerca da temática.
Tal fato, aliás, ganha relevo ao que vem assentando o Tribunal da Cidadania nesta seara, conforme o seguinte e recente aresto a respeito:
“STJ. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. BENEFICIÁRIO. EQUIPARAÇÃO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO ÓBITO. MED. PROV. 1.523/96. A pensão por morte a ser paga ao menor sob guarda deve observar a lei em vigor na data do óbito do segurado, pois esse é o fato gerador para a concessão do benefício previdenciário: se o falecimento ocorreu antes da edição da Medida Provisória 1.523, de 11/10/96, o recebimento está assegurado; se a morte ocorreu depois, o menor não tem direito ao benefício. A conclusão é da 05ª Turma do STJ, que definiu também que o menor sob guarda não pode mais ser equiparado ao filho de segurado para fins de dependência. De acordo com o voto do relator, Min. Gilson Dipp, o reconhecimento do direito à pensão por morte não é mais possível após as alterações promovidas pela Med.Prov. 1.523/96, reeditada até sua conversão na Lei 9.528, em 10/12/1997”.[5]
Do citado julgado do Colendo Tribunal, afere-se duas vertentes a respeito, sendo uma, no tocante a data do óbito, como ponto principal do marco temporal da incidência legislativa e de outro lado, ratifica a posição do guardião da lei federal acerca da impossibilidade da equiparação do menor sob guarda tão somente pela existência desta e da previsibilidade constitucional.
No tocante a primeira premissa, se mostra acertada a análise do Sodalício, que vai de encontro com o posicionamento doutrinário.
Tal vertente, ganha voz, nas preciosas lições do Professor Hermes Arrais Alencar:
“Em atenção ao art.5º, inciso XXXVI, da Carta Magna, permanece incólume o direito daqueles menores que, em decorrência do óbito do seu guardião anteriormente à MP 1.523, percebem benefício de pensão por morte enquanto não ocorrida a emancipação ou o implemento da idade de 21 anos”.[6]
Logo, para a pensão previdenciária, o evento morte determina a legislação a ser observada.
Neste sentido, o caminho trilhado pelo próprio STJ:
“...é a data do óbito, em se tratando de pensão por morte,que assinala a lei de regência do benefício”; [7]
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MORTE PRESUMIDA. TERMO INICIAL. FATO GERADOR DO BENEFÍCIO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. TEMPUS REGIT ACTUM. RECURSO IMPROVIDO. 1. A pensão por morte é um benefício previdenciário previsto no art. 74 da Lei nº 8.213/91, pago aos dependentes em virtude do falecimento do segurado. Para fazer jus a ela é imprescindível que os dependentes comprovem o preenchimento dos requisitos necessários à obtenção do benefício, quais sejam: o óbito do de cujus, a relação de dependência entre este e seus beneficiários e a qualidade de segurado do falecido. 2. A controvérsia dos autos está atrelada à analise de um desses requisitos, que se revela no próprio fato gerador do benefício, qual seja, o óbito do de cujus e, em corolário, o seu termo inicial em caso de morte presumida. 3. Existência de prévia decisão judicial que, apesar de prolatada em 1998, reconheceu, com fulcro no art. 88 da Lei nº 6.015/73, o desaparecimento do segurado no mar em junho de 1990.
4. Sendo o fato gerador da pensão in comento a morte do mantenedor, conclui-se que a legislação aplicável ao vertente caso, nos moldes da jurisprudência consolidada desta Corte, é a aquela vigente na data do reconhecido óbito, ou seja, o Decreto nº 88.030/79, convalidado pelo Decreto nº 89.312/84, que expediu a nova edição de Consolidação das Leis da Previdência Social, e não a Lei nº 8.213/91, sustentada pela recorrente. 5. Não há falar, pois, em termo inicial do benefício a partir de decisão judicial, no caso de morte presumida, pois inaplicável, à espécie, o dispositivo que traz em seu bojo tal regra, bem seja, o art. 74, III da citada lei. 6. Recurso especial ao qual se nega provimento”;[8]
Ainda, nesta vertente, o próprio Excelso Tribunal também se posicionou a respeito:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. O benefício previdenciário rege-se pela lei do tempo em que reunidas as condições para sua concessão. Principio tempus regit actum. Agravo regimental ao qual se nega provimento”; [9]
Pois bem, evidente que em uma singular análise, fácil detectar a data do óbito, como fato gerador da incidência da proteção previdenciária ao beneficiário, desde que observados os ditames legais, pouco importando então se o requerimento do benefício se deu em datas posteriores as várias mudanças legislativas, ou mesmo, se o instituidor do benefício já percebida aposentadoria em épocas distintas de textos legais alterados no tempo.
Entretanto, intrincada e tormentosa o estudo no que pertine ao menor sob guarda judicial.
Ao que se vê, a mais recente jurisprudência do STJ reputa qualquer equiparação, mas, nem sempre foi assim.
De fato, por vários anos, mesmo em períodos posteriores a mudança na legislação que excluiu o menor sob guarda do rol de dependentes previdenciários, analisou o Superior Tribunal a questão, de forma harmoniosa e consentânea aos postulados constitucionais:
“MENOR SOB GUARDA - § 2º, art. 16 da L. 8.231/91. Equiparação a filho. Fins previdenciários. L. 9.528/97. Rol de dependência. Exclusão. Proteção ao menor. Art. 33, § 3º, da L. 8.069/90. ECA. Guarda e dependência econômica. Comprovação. Benefício. Concessão. Possibilidade. Precedentes do STJ. A redação anterior do § 2º do art. 16 da L. 8.213/91 equiparava o menor sob guarda judicial ao filho para efeito de dependência perante o RGPS. No entanto, a L. 9.528/97 modificou o referido dispositivo legal, excluindo do rol do art. 16 e parágrafos esse tipo de dependente. Todavia, a questão merece ser analisada à luz da legislação de proteção ao menor. Neste contexto, a L. 8.069/90 - ECA - prevê, em seu art. 33, § 3º, que: "a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciário". Desta forma, restando comprovada a guarda, deve ser garantido o benefício para quem dependa economicamente do instituidor, como ocorre na hipótese dos autos. Precedentes do STJ”;[10]
“PENSÃO POR MORTE - Menor sob guarda. § 2º, art. 16, da Lei nº 8.231/91. Equiparação a filho. Fins previdenciários. Lei nº 9.528/97. Rol de dependência. Exclusão. Proteção ao menor. Art. 33, § 3º, da Lei nº 8.069/90. ECA. Guarda e dependência econômica. Comprovação. Benefício. Concessão. Possibilidade. Precedentes do STJ. Agravo interno desprovido. I - A redação anterior do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/91 equiparava o menor sob guarda judicial ao filho para efeito de dependência perante o Regime Geral de Previdência Social. No entanto, a Lei nº 9.528/97 modificou o referido dispositivo legal, excluindo do rol do art. 16 e parágrafos esse tipo de dependente. II - Todavia, a questão merece ser analisada à luz da legislação de proteção ao menor. III - Neste contexto, a Lei nº 8.069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente - prevê, em seu art. 33, § 3º, que: "A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciário". IV - Desta forma, restando comprovada a guarda, deve ser garantido o benefício para quem dependa economicamente do instituidor, como ocorre na hipótese dos autos. Precedentes do STJ”;[11]
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA DEPENDENTE DO SEGURADO. EUIPARAÇÃO A FILHO. LEGISLAÇÃO DE PROTEÇÃO AO MENOR E ADOLESCENTE. OBSERVÂNCIA. A Lei nº. 9.528/97, dando nova redação ao art.16 da Lei de Benefícios da Previdência Social, suprimiu o menor sob guarda do rol de dependentes do segurado. Ocorre que, a questão referente ao menor sob guarda deve ser analisada segundo as regras da legislação de proteção ao menor: a Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente”.[12]
Pela análise até aqui esposada, fácil conferir que grande área ainda há para percorrer a respeito, não sendo de todo unânime o entendimento exarado pelo guardião da legislação federal pelos anos.
Por certo, que há aqui um aparente confronto de normas, premissas, valores e princípios, cabendo as fontes do direito alicerçar a ciência jurídica de argumentos consolidadores, para a proclamação ou não da equiparação.
Situação inusitada é a previsibilidade do menor tutelado, continuar a ser dependente legal para efeitos previdenciários em contra-ponto ao menor sob guarda, já excluído.
Por este ângulo, preferiu o legislador privilegiar a tutela do que a guarda judicial, advinda por um pronunciamento do Estado, não se sabendo ao certo, os motivos da diferenciação de dois institutos de direitos civis de aproximada índole e finalidade comum, quer seja, da proteção aos interesses do infante.
Assim, por exemplo, dois menores, um tutelado e outro, submetido a uma guarda judicial, para a mesma relação previdenciária terão tratamentos díspares, em frontal ataque ao princípio isonômico, sem falar do dever público, inserto na Lei Maior que anseia pela proteção dos interesses de todos os menores.
Pensando desta forma, o Colendo Tribunal Regional da 01ª Região, em memorável decisão afastou a tese autárquica que defendia a não equiparação do menor sob guarda:
“Aliás, a constatação de que o menor sob guarda que dependia de segurado falecido em momento anterior à vigência da Lei nº 9.528/1997, permanece como beneficiário da Previdência Social, reforça o direito daqueles menores que, vinculados pelo instituto da guarda ao segurado do INSS, também em momento anterior à norma restritiva de direitos, tiveram tal vínculo rompido pelo óbito ocorrido após a edição desta. De fato, o art. 227 da Constituição Federal prevê, em seu caput, que a criança e o adolescente têm de ser postos a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Ora, impedir-se que um menor contemplado pela guarda de um segurado da Previdência Social, no mesmo momento em que outro, usufrua determinado benefício previdenciário posto à disposição deste, como decorrência de uma álea que não está sob o seu controle (data do óbito do instituidor), configura, sem dúvida alguma, discriminação não consentânea com o verbete constitucional acima mencionado. Ainda quanto a esse tema, vejo também a confluência de disposições constitucionais e legais que apontam no sentido de que o menor sob guarda não pode ser discriminado em relação à criança aos auspícios da tutela, reforçando, pois, a conclusão de que o só fato de a Lei nº 9.528/1997 ter retirado a sua presença do texto da Lei nº 8.213/1991 não é bastante para a supressão do direito ao pensionamento. A colidência da supressão do benefício de pensão por morte em favor do menor sob guarda com os dispositivos trazidos a colação é, a meu ver, flagrante, porque não se pode conceber, data vênia, que direitos previdenciários relativos a benefícios já previstos na legislação de regência possam ser assegurados aos menores sob tutela, e retirados dos menores sob guarda, sem que isso constitua inaceitável discriminação vedada, como já dito, pelo caput do sobredito art. 227”.[13]
Sabido que toda a mudança legislativa deve atingir uma finalidade específica, uma adequação social relevante, de forma a tornar o fenomênico em adequação legal, condensando em normas, valores ou princípios reputados imprescindíveis de toda a ordem jurídica.
Em que pese a atual e mais recente posição do STJ a respeito, nítido o disparate legislativo, frente a outros postulados no tocante ao menor sob aguarda.
De todo o modo, a legislação não se apresenta como única luz no fim do túnel, mas conduz o intérprete do direito ao esperado raciocínio jurídico da questão posta para análise.
Pensar friamente nesta questão, pela simples literalidade normativa, é encontrar a possibilidade de fraude, como isolada razão para o legislador operar a exclusão da equiparação.
A harmonia dos sistemas jurídicos também passa pela harmoniosa junção de normas, que devem condensar os anseios de toda uma coletividade, o que foi feito, com as premissas calcadas no texto constitucional pelo Poder Originário.
Pensar exclusivamente na fraude, como óbice para a equiparação do menor sob guarda, é reprimir e retardar sobremodo o dever de cuidado e proteção do Poder Público com o próprio menor, negando vigência ao comando constitucional específico, além de, dentre outras várias razões, confessar a fragilidade total do sistema de fiscalização do próprio Estado, mostrando sua vulnerabilidade em tempos de vultuoso crescimento da era digital e mecanismos de controle, fazendo a regra, virar a exceção.
A este propósito, pensou também o próprio STJ a respeito:
“...existem muitas guardas que são legítimas, a pessoa obtém a guarda de um menor legitimamente, pois quer proteger, tem condições, acha que é justo e merecido. Mas, aquele menor que está legitimamente numa situação desta, será colocado numa vala comum porque existem fraudes? As fraudes devem ser combatidas pela fiscalização, pela policia, pelo aparelho preventivo e repressivo que a legislação coloca à disposição da nossa sociedade”.[14]
CONCLUSÕES
Verdadeiramente, essa intrincada questão merece profundo debate, já que não sedimentada de vez no cenário jurídico.
Independente das correntes existentes, cabe aqui ressaltar a grande contribuição que o STJ tem conferido não só a esse assunto, mas a várias outras questões previdenciárias de alto relevo. Por isto, denominado Corte de Superposição.
No tocante ao mérito do estudo, as divergências da doutrina e da jurisprudência acabam por corroborar a importância do Direito Previdenciário no trato diário, adequando os fatos, ao máximo possível do que almejou o legislador.
Assim, em havendo plano de proteção, como antes demonstrado, alocado, aliás, em arcabouço sistêmico constitucional, razão há para que todos os destinatários desta vontade protetiva devam ser tratados de forma igual e em harmonia com as próprias premissas condensadas em normas, cujos preceitos, derivam da própria vontade dos sujeitos protegidos.
A este aspecto, salutar concluir com as lições do Professor Miguel Horvath: “...as normas previdenciárias consistem em clausulas pétreas implícitas na categoria de normas intangíveis relativas aos direitos fundamentais”.[15]
Referências bibliográficas
ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. 4ª ed. São Paulo: EUD. 2010. p.227;
BALERA, Wagner. Legislação Previdenciária Anotada. 1ª ed. São Paulo: Conceito. 2011. p.276;
BERBEL, Fabio Lopes Vilela. Teoria Geral da Previdência Social. São Paulo: Quartier Latin, 2005;
HORVATH JUNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. 8ª ed. São Paulo: Quartier Latin. 2010. p.156;
Boletim Informativo nº.180/181 do IBDP, de 01/12/2011;
STF – Ag.Rg-Al 765.377 – Relatora Ministra Carmen Lucia – 24/09/2010.
STJ – Ag.Rg no Recurso Especial nº 627.474 – RN (2003/0216181-1) – Rel.Min. Felix Fischer.
STJ – RESp. nº 414.600/SC – Rel.Maria Tereza de Assis Moura – 06ª Turma 0 06/12/2008.
STJ - AgRg-REsp 684.077 - RJ - 5ª T. - Rel. Min. Gilson Dipp - DJU 21.02.2005.
STJ - AgRg-REsp 696.299 - PE - 5ª T. - Rel. Min. Gilson Dipp - DJU 18.04.2005.
STJ – RESp. 642915 – Relatora Min. Laurita Vaz – DJU 16/10/2006.
STJ – RESp. 844.598-PI – Voto do Ministro Arnaldo Esteves Lima.
TRF 1ª Região – AP.MS n.º 2004.33.00.021289-4/BA – Relatora Desembargadora Neuza Alves – 28/01/2010.
Notas:
[1] BERBEL, Fabio Lopes Vilela. Teoria Geral da Previdência Social. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
[2] HORVATH JUNIOR, Miguel. Direito Previdenciário. 8ª ed. São Paulo: Quartier Latin. 2010. p.156.
[3] ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios Previdenciários. 4ª ed. São Paulo: EUD. 2010. p.227.
[4] BALERA, Wagner. Legislação Previdenciária Anotada. 1ª ed. São Paulo: Conceito. 2011. p.276.
[5] Boletim Informativo nº.180/181 do IBDP, de 01/12/2011.
[6] Op. Cit. pag. 230.
[7] STJ – Ag.Rg no Recurso Especial nº 627.474 – RN (2003/0216181-1) – Rel.Min. Felix Fischer.
[8] STJ – RESp. nº 414.600/SC – Rel.Maria Tereza de Assis Moura – 06ª Turma 0 06/12/2008.
[9] STF – Ag.Rg-Al 765.377 – Relatora Ministra Carmen Lucia – 24/09/2010.
[10] STJ - AgRg-REsp 684.077 - RJ - 5ª T. - Rel. Min. Gilson Dipp - DJU 21.02.2005.
[11] STJ - AgRg-REsp 696.299 - PE - 5ª T. - Rel. Min. Gilson Dipp - DJU 18.04.2005.
[12] STJ – RESp. 642915 – Relatora Min. Laurita Vaz – DJU 16/10/2006.
[13] TRF 1ª Região – AP.MS n.º 2004.33.00.021289-4/BA – Relatora Desembargadora Neuza Alves – 28/01/2010.
[14] STJ – RESp. 844.598-PI – Voto do Ministro Arnaldo Esteves Lima.
[15] Op.Cit. pag.37.
Informações Sobre o Autor: Sérgio Henrique Salvador
Professor de TGP, Processo Civil, Direito Previdenciário e Advogado do Núcleo de Prática Jurídica do Curso de Direito do Centro Universitário de Itajubá - FEPI. Advogado em MG. Escritor. Professor do IBEP/SP. Especialista pela EPD/SP e PUC/SP
Fonte:
Âmbito Jurídico.com.br
Por Sérgio Henrique Salvador
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